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TST aumenta de R$ 10 mil para R$ 250 mil indenização por trabalho com amianto

A 2ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho aumentou de R$ 10 mil para R$ 250 mil a indenização que a Saint-Gobain do Brasil terá de pagar a cada um dos filhos de um advogado que morreu com asbestose, doença causada pela aspiração de amianto. De acordo com os ministros, o valor anterior era muito baixo em comparação a casos semelhantes, e a coexistência de outras doenças não reduz a gravidade da contaminação ocorrida no trabalho.

Cobertura que usa amianto na sua fabricação

Morto em janeiro de 2014, vítima de grave insuficiência respiratória, o advogado atuara, entre 1970 e 1998, na fábrica da Brasilit (sucedida pela Saint-Gobain) em Recife. Na época, alguns produtos tinham como matéria-prima o amianto. A aspiração do pó dessa substância gera a asbestose, que afeta o tecido pulmonar, segundo alguns estudos científicos.

Como o atestado de óbito apontou a doença como uma das causas da morte, dois filhos do advogado apresentaram ação judicial em busca de indenização. 

A defesa da empresa pediu que, em caso de condenação, a sentença levasse em consideração outras doenças que também contribuíram para o falecimento, como diabetes, hipertensão, tabagismo, enfisema pulmonar e tuberculose. O juízo da 2ª Vara do Trabalho do Recife julgou procedente o pedido dos filhos do advogado.

Todavia, ao considerar a ponderação da Saint-Gobain, fixou a indenização em R$ 10 mil para cada herdeiro. O Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região (PE) manteve a decisão.

O relator do recurso de revista dos herdeiros, ministro José Roberto Pimenta, considerou o valor fixado nas instâncias ordinárias muito aquém das indenizações deferidas em casos semelhantes. Ao propor sua majoração, ele considerou a gravidade da asbestose, o grande porte econômico da empresa e sua conduta omissiva durante muitos anos.

Quanto às outras doenças, o relator afirmou que os elementos apontados na sentença como concausa para a morte do empregado não são suficientes para diminuir o valor da indenização por danos morais, tendo em vista que o advogado faleceu por grave insuficiência respiratória quando tinha asbestose. A decisão foi unânime. Com informações da assessoria de imprensa do TST.

RR 1-30.2016.5.06.0002

Está mais do que na hora da Eternit saldar sua dívida social com as vítimas do amianto

Direito à saúde e amianto: a fibra do diabo em Bom Jesus da Serra

A busca ilimitada do homem pelo progresso, mesmo à custa de valores que forjaram a nossa sociedade, já foi bem retratada em muitas obras. Na que é talvez a mais famosa, Goethe descreve o acordo entabulado entre Fausto e o Diabo – Mefistófeles –, que permite ao primeiro personagem adquirir extenso patrimônio.

Na terceira cena do quinto ato, Mefistófeles relata a Fausto como se livrou de dois anciães que representavam uma barreira ao anseio desenvolvimentista do personagem principal, relatando a ele que “[d]eles livramos-te num triz/não sofreu muito o par vetusto/caiu sem vida, já, com o susto”[1].

Antes, Linceu, que observava a ação destrutiva do alto da Torre, afligiu-se com a situação e, em referência também a agressão a natureza, expressou seu descontentamento: “[O] que a vista deliciava, com os séculos se foi” [2]. Idêntico desalento sente quem acompanhou a saga da exploração do amianto em Bom Jesus da Serra.

Bom Jesus da Serra é um município baiano, distante 395 km de Salvador. Em 1936, no então vilarejo de Bom Jesus da Serra, Hipólito Pujol descobriu uma jazida de amianto, que, por aproximadamente três décadas, foi a principal fonte de abastecimento do mercado nacional. A partir de 1940, a jazida passou a ser explorada comercialmente pela empresa Sama Minerações Associadas Ltda.

A exploração da mina se fez sem observância de normas de segurança que pudessem evitar ou minorar os impactos à saúde decorrentes da exposição dos trabalhadores ao amianto. As suas famílias foram inadvertidamente expostas ao minério, seja na forma de resíduos conduzidos até as suas residências, seja na forma de brita utilizada para construção civil, ornamentos de decoração ou, simplesmente, impregnados nas vestes dos trabalhadores.

Com o exaurimento da mina e a descoberta da jazida de Canabrava, em Minaçu/GO, a área foi abandonada e as atividades minerárias formalmente encerradas em 24/04/1971. As marcas de quase quatro décadas de exploração desabrida ficaram. A paisagem, a flora, o solo e o relevo foram degradados em razão de escavações e detonações. Os rejeitos foram lançados a céu aberto. Um vale artificial, com encostas íngremes e instáveis, foi deixado.

O abandono de pilhas de rejeito de mineração (serpentino) no local, sem nenhum controle, gerou o inconveniente da sua utilização – sem qualquer atenção às cautelas necessárias – na construção civil. Há relatos de seu emprego até mesmo na pavimentação da estrada que liga Bom Jesus da Serra a Poções.

A gravidade da situação foi levada ao conhecimento do Ministério Público do Estado da Bahia e, posteriormente, do Ministério Público Federal, a partir de 2000, por meio de representações formuladas pela Associação Brasileira do Amianto Crisotila e pela Comissão de Proteção ao Meio Ambiente da Assembleia Legislativa da Bahia.

Para apuração dos fatos, foram instaurados três inquéritos civis, depois reunidos, nos quais foram coletadas diversas provas, especialmente depoimentos de potenciais vítimas, compilação de cópias de exames médicos, relatórios de vistorias e laudos periciais.

Nesse contexto, são de grande importância, pelo rigor científico e riqueza de detalhes, os relatórios e laudos produzidos pelo IBAMA[3], DNPM[4], SRH[5], CRA[6], CESAT[7], Fundação José Silveira[8], Fundacentro[9] e Ceama[10].

Com fundamento nesses dados todos, o Ministério Público Federal e o Ministério Público do Estado da Bahia uniram esforços e ajuizaram, no primeiro semestre de 2009, duas ações civis públicas, uma tendo por propósito a reparação dos danos ambientais, e outra o amparo à saúde das vítimas da exposição ao amianto.

Para sua identificação, optou-se pela realização, no curso do próprio processo, de uma busca ativa. Para esse trabalho foi fundamental a capacitação de agentes comunitários de saúde, feita pelo CESAT e pelo CEREST[11].

Em 2019, ambas as ações foram sentenciadas pela Justiça Federal em Vitória da Conquista/BA. Na ação ambiental, a Sama S.A. e a Saint-Gobain do Brasil foram condenadas ao pagamento de R$ 31.423.370,00 a título de danos morais coletivos, além das seguintes obrigações: realocação topográfica das pilhas de rejeito, afixação de placas de advertência, demolição e reconstrução de edificações erguidas com rejeitos; e implementação de plano de recuperação de área degradada.

Na ação da saúde, a Sama S.A. foi condenada a fornecer plano de saúde; depositar mensalmente a quantia de um salário mínimo e meio aos contaminados; e a pagar danos morais no valor de R$ 150.000,00, além de fornecer todos medicamentos e equipamentos necessários ao eventual tratamento de pacientes acometidos de doença associada ao amianto.

As sentenças foram impugnadas pelas rés. Até o momento, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região apreciou apenas um dos dois recursos, oportunidade em que alterou pontos essenciais do julgamento proferido em primeiro grau.

Foram excluídas da condenação algumas das obrigações destacadas acima, em especial, a realocação topográfica das pilhas de rejeito, afixação de placas de advertência, demolição e reconstrução de edificações erguidas com rejeitos.

Nada obstante, resultados concretos foram alcançados, especialmente na ação da saúde.

Inicialmente, apenas onze pessoas haviam sido identificadas com alguma alteração de saúde em razão da exposição ao amianto. Posteriormente, o Ministério Público Federal teve acesso a avaliações individuais realizadas em pesquisa desenvolvida em conjunto pela Universidade de São Paulo, Universidade Federal de São Paulo e Universidade Estadual de Campinas, que permitiram a extensão das obrigações impostas na sentença a mais 38 trabalhadores, em razão do desenvolvimento de placas pleurais ou câncer associado ao amianto.

Atualmente, todos eles gozam de plano de saúde e pensão de alimentos provisionais no valor de um salário mínimo e meio. Em nome de todos eles, o Ministério Público Federal requereu também a habilitação do crédito individual de R$ 150.000,00 na recuperação judicial da Eternit (controladora da Sama S.A.) em andamento na Justiça Estadual de São Paulo.

O trabalho ainda não foi encerrado. O Ministério Público Federal e o Ministério Público do Trabalho, em conjunto com as Prefeituras de Vitória da Conquista, de Poções, de Bom Jesus da Serra, e Planalto, além da CESAT e do CEREST, continuam a busca ativa de expostos ambientais ou laborais que desenvolveram alguma doença associada ao amianto. A nocividade do produto e o período de latência entre a exposição a ele e o surgimento de alguma alteração de saúde impõem atenção constante.

Por sua resistência a altas temperaturas e pelos riscos que o envolvem, o amianto tem o triste apelido de “fibra do diabo”. Todavia, nas palavras de Riobaldo, nosso Fausto da Caatinga, “[o] diabo não há! É o que eu digo, se for… Existe é homem humano. Travessia” [12].

É contra a atuação deletéria do homem em Bom Jesus da Serra que o outrora conivente Estado brasileiro passa a agir, desincumbindo-se do dever de restaurar o meio ambiente e a saúde degradados.

***Este texto faz parte da série Histórias e direitos humanos – Vivências no MPF, composta por artigos de procuradores da República sobre suas vivências no órgão. Leia os textos que já foram publicados:

VÍTIMAS DO AMIANTO DE MINAS GERAIS SÃO AVALIADOS POR EQUIPE ESPECIALIZADA DO INCOR/SP

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VÍTIMAS DO AMIANTO DE MINAS GERAIS SÃO AVALIADOS POR EQUIPE ESPECIALIZADA DO INCOR/SPVÍTIMAS DO AMIANTO DE MINAS GERAIS SÃO AVALIADOS POR EQUIPE ESPECIALIZADA DO INCOR/SP
Pena que ainda não temos em todo Brasil centros de altas especialização e complexidade à disposição das vítimas do amianto e com um acolhimento tão humanizado. 
Obrigada aos doutores Ubiratan de Paula Santos, Jefferson Benedito Pires de Freitas e Rafael Futoshi Mizutani e toda a equipe do INCOR/Hospital das Clínicas de SP da Universidade de São Paulo. 
Sábado, 22 de outubro, EX-EMPREGADOS DA PRECON DO ESTADO DE MINAS GERAIS  EXPOSTOS AO AMIANTO PASSARAM POR EXAMES CLÍNICOS, RAIO X, TOMOGRAFIA  E ESPIROMETRIA. 
Lembro-os que a Precon, fábrica de artefatos de cimento-amianto (a última a substituir a fibra mortal em nosso país) se situa na grande Belo Horizonte, capital do estado de Minas Gerais, um dos mais populosos e desenvolvidos economicamente do país, onde infelizmente o SUS-Sistema Único de Saúde não cumpre adequadamente seu papel de vigilância epidemiológica e assistência à saúde de sua população, em especial as vítimas do amianto. 
Sábado próximo (14/11) novo grupo de 19 expostos serão avaliados pela equipe do INCOR/SP.
Lembrando que Pedro Leopoldo, Estado de Minas Gerais, é atualmente a capital nacional das vítimas de mesotelioma maligno de pleura, o câncer do amianto.

Live do Diesat marca 30 anos da luta pelo banimento do amianto no Brasil

Resgatar a luta pelo banimento do amianto e os desafios a serem enfrentados foram os objetivos da live quarta, 21, pelo Departamento Intersindical de Estudos e Pesquisas de Saúde e dos Ambientes de Trabalho. “Convidamos representantes da sociedade e atores que fazem parte dessa luta histórica”, explica Eduardo Bonfim, coordenador-técnico do Diesat.

Participaram o dr. Ubiratan de Paula Santos, pneumologista do Instituto do Coração; Fernanda Giannasi, da Abrea (Associação Brasileira dos Expostos ao Amianto); Luciano Lima Leivas, do Ministério Público do Trabalho; e Simone Alves dos Santos, diretora-técnica do Cerest Estadual.

O amianto é usado, principalmente, na fabricação de telhas e largamente empregado em residências populares e caixas de água em residências. Cerca de metade das residências do País utiliza telhas compostas pela fibra mineral.

Eduardo diz que, em 2017, o Supremo Tribunal Federal proibiu o uso do amianto. Mas a decisão do STF não pôs fim à luta. E afirma: “Diversas questões persistem. Ainda há muito a se fazer”.

Saúde x Emprego - Apesar de banido judicialmente, empresas nacionais ainda exportam o produto. “Muitas vezes, a atividade é apoiada pela população local, que vê uma forma de sustentação financeira. Não pensam nos males que o manuseio do produto traz à saúde”, conta.

Segundo a Organização Mundial da Saúde, a substância causa mais de 100 mil mortes por ano. Todas as formas de amianto são cancerígenas. O principal câncer relacionado à toxina é o mesotelioma, que acomete o pulmão. É uma doença que pode demorar até 40 anos pra se manifestar a partir da exposição ao amianto e pode matar em cerca de um ano.

Consciência - Para conscientizar a população sobre o prejuízo do uso do produto, o Diesat realiza, em parceria com entidades como Abrae, Cerest e Ministério Público do Trabalho, campanha que já dura 30 anos. Bonfim explica: “Como os sintomas demoram a aparacer, o trabalhador não liga a doença à manipulação do produto feita por décadas”. A Abrea visita as cidades pra tentar conscientizar quem atua ou atuou com a manipulação do amianto.

Seminário - Em novembro, o Diesat realiza o 3º Seminário Internacional pra debater os desafios ainda existentes. A atividade é gratuita e aberta à população. Será em São Paulo.


Fonte:  Agência Sindical - 26/10/2020

Quem não gosta de amianto?

Valorização das ações da Eternit chama a atenção por ocorrer quando ESG ganha destaque no debate sobre investimentos

Tirando o arroz, o que mais você consegue dizer que dobrou de preço? O alimento essencial na mesa do brasileiro cumpriu essa façanha em 12 meses. As ações da Eternit, em 45 dias.

A empresa, que ficou conhecida pelas telhas e caixas d’água com amianto, está em recuperação judicial desde o meio do ano passado. Nos últimos dias, tem sido vista com otimismo por investidores.

Os papéis ETER3, que, no dia 1º de setembro, podiam ser compradas com uma nota de R$ 5 (e tinha troco), chegaram ser vendidas por R$ 9,03 nesta quarta-feira (14).

Com isso, o valor de mercado da Eternit foi de R$ 242 milhões para R$ 466 milhões. Em um mês e meio.

O ritmo de negociações dos papéis subiu tanto que a B3, empresa que controla a Bolsa de Valores, cobrou explicações da companhia. Duas vezes.

Já que não havia sido divulgada nenhuma informação nova ao mercado, por que um papel cuja média de negociação por dia é de 1,7 milhão, passar a ser negociado 3,6 milhões de vezes em um único pregão?

As respostas da Eternit aos dois ofícios da B3 foram quase idênticas, dizendo não saber o que pode ter acontecido.

                                                        


Telha exibe carimbo indicando que contém amianto - Marcelo Justo - 19.fev.2008/Folhapress

“A administração desconhece qualquer fato que não tenha sido divulgado ao mercado ou não seja de conhecimento público que possa ter justificado a movimentação”, dizem os documentos da empresa.

Dias depois da primeira manifestação, o presidente da Eternit, Luís Augusto Barbosa, foi à imprensa.

Em longa entrevista, falou sobre os investimentos da empresa em transformar seu negócio para produzir equipamentos de alta tecnologia, como as telhas de concreto que captam energia solar.

A tal telha fotovoltaica é destacada no último balanço divulgado pela empresa. Nos primeiros seis meses do ano, foram captados R$ 46 milhões para investimento no projeto e na “modernização do fibrocimento”, que não tem mais amianto em sua composição.

As telhas solares, no entanto, ainda não são vendidas nem geram lucro para companhia. De certa forma, parece contra o pragmatismo do nosso mercado que tamanha valorização das ações tenha se dado pelo plano de investir na área tecnológica.

Os números frios trazem pontos que parecem mais interessantes pela lógica do mercado. No segundo trimestre do ano, a receita líquida da Eternit cresceu 19% em relação ao mesmo período em 2019.

Apesar de a discussão sobre tecnologia fotovoltaica fazer parecer que a exploração do mineral é página virada na vida da Eternit, no primeiro semestre de 2020, a empresa exportou 23,7 toneladas de amianto. Um aumento de 50% em relação a 2019.

A mina explorada pela empresa, em Goiás, havia sido paralisada em fevereiro de 2019.

Dois meses depois, senadores foram ao local e clamaram pela liberação da exploração de amianto, para “geração de riqueza do país” e “garantir o emprego dos trabalhadores”.

A comissão contava com o presidente do Senado Davi Alcolumbre (DEM-AP) e com o então vice-líder do governo Bolsonaro no senado Chico Rodrigues (DEM-RR) —que ficou famoso nesta semana por fazer poupança de forma inusitada durante uma operação policial.

Menos de um ano depois da visita ilustre, com base em uma nova lei goiana, a extração e o beneficiamento de amianto foram autorizados, para fins exclusivos de exportação. E a Eternit voltou a vender suas toneladas amianto.

O beneficiamento do mineral é feito, hoje em dia, seguindo diversas normas de segurança. Ainda assim, a valorização extraordinária das ações da empresa chama a atenção justamente por ocorrer no momento em boas práticas ambientais, sociais e de governança (ESG, na sigla em inglês) ganham cada vez mais destaque nas discussões sobre investimentos.

Marcos de Vasconcellos

Jornalista, empreendedor e fundador do site Monitor do Mercado.

 

Fonte: http://amianto-amianto.blogspot.com/2020/10/quem-naogosta-de-amianto-valorizacao.html

Batizada em homenagem a mineral que pode matar, cidade vai mudar de nome

45º46'N, 71º56'O
Asbestos
Quebec, Canadá
Asbestos, em Quebec, tem 7 mil habitantes e uma questão para resolver com seu próprio passado. É
possível uma cidade carregar no nome um mineral altamente perigoso, banido em 67 países? Para a
prefeitura local, não mais.
Em 2019, um referendo para mudar o nome da cidade foi aprovado. Das cerca de mil sugestões
propostas, quatro são finalistas: Phénix (em referência à ave mitológica que renasce no fogo),
Apalone (um gênero de tartarugas da América do Norte), Trois-Lacs ("três lagos", em francês –
homenagem a uma localidade das redondezas) ou Jeffrey (nome da mina de onde se extraiu
amianto por décadas).
Asbesto, conhecido no Brasil como amianto, é a denominação comercial de uma família de
minérios usada largamente na indústria no século passado. Gerações associaram o amianto a
telhas onduladas acinzentadas e a caixas d'água, mas o material também foi usado para a
fabricação de freios e embreagens e na produção de filtros, papel e isolantes térmicos.
No começo do século 20 já começaram a surgir as primeiras mortes documentadas causadas por
amianto. Em geral eram mineiros que, após anos de trabalho pesado, tinham os pulmões cheios de
traços de asbesto. Em 1924, surgiu o primeiro diagnóstico de asbestose. O pó do amianto contém
fibras que, quando inaladas, se fixam no pulmão, deixando cicatrizes que comprometem o órgão. A
OMS também incluiu o amianto na lista das principais substâncias cancerígenas.
Diversas leis surgiram ao longo das décadas para controlar ou banir o uso de amianto. No Brasil,
ele é proibido em todo o território desde 2017.

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Asbestos, no Canadá (foto: Pierre-Paul Drouin/wikimedia commons)
ASBESTOS, O MUNICÍPIO
A cidade de Asbestos não ganhou tal nome porque um coronel local gostava dessa palavra (que
vem do grego e significa "indestrutível" ou "inextinguível"). Não foi uma excentricidade à toa.
Jeffrey era, até outro dia – ou melhor, até 2011, quando encerrou as operações após 130 anos – a
maior mina de extração de amianto do mundo. A maior empregadora, a maior fonte de renda da
cidade. O coração de Asbestos.
Exemplos de lugares batizados em homenagem a seus grandes produtos existem às baciadas. No
Brasil, as mineiras Ouro Preto e Diamantina são os clássicos da lista, mas ainda tem a maranhense
Açailândia e a paulista Alumínio.
"Ah, mas quero ver lugar com nome de substância mortal, poluente etc." Existe uma Tabaco nas
Filipinas. Os Estados Unidos têm a cidade do petróleo (Oil City, Pensilvânia) e a do carvão (Coal
City, Illinois). E a Rússia também tem a sua Asbest.
Por isso, a proposta de mudar o nome da cidade divide a população, já que é muito difícil dissociar
o município do produto. Asbestos não existiria hoje, pelo menos não do jeito que é, se não fosse a
mina.
Mas é preciso manter um nome com conotação negativa (talvez ainda mais explícita que petróleo,
carvão ou até tabaco)? Após décadas de estudos comprovados e tantas mortes causadas pelo
amianto? Eis o questionamento. Além disso, a carga pesada do nome "Asbestos" até afastou
investidores recentemente, alega a prefeitura.

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A mina de Jeffrey em 1944 (foto: Harry Rowed/domínio público)
Asbestos é uma cidade quase totalmente francófona de Quebec, a única das dez províncias
canadenses onde o francês é a língua oficial, além de Nova Brunswick, em que o francês divide o
posto com o inglês. Em francês, a palavra para o polêmico material tem a mesma origem grega que
em português: "amiante" (puro, sem mácula). Logo, alguns habitantes não viam problema em
manter o nome do município, já que a ligação não seria tão direta. Afinal, para a
população, amiante é o minério, Asbestos é a cidade.
Esse argumento, aliás, foi usado muitas vezes em outras tentativas de mudança. Só que dessa vez
não colou.
Jeffrey, a meu ver, seria uma opção para quem deseja manter a referência histórica da cidade, mas
sem a relação escancarada com o amianto. O problema, para alguns, é mudar para um nome inglês
em uma cidade que fala francês. Que seja Trois-Lacs então, um pedacinho bucólico de natureza
local. Pode ter boas chances. Entre os dias 14 e 18, os moradores de Asbestos poderão votar e
decidir.
ASBESTOS E O CANADÁ
A mina tem uma grande importância para a história política de Quebec e do Canadá. Em 1949, os
mineiros entraram em greve, pedindo, entre outras melhorias trabalhistas, proteção a doenças
causadas pelo amianto. Após um mês de paralisação e sem chegar a acordo algum, a chapa
esquentou, alguns grevistas partiram para a violência, a polícia desceu o cassetete e a repressão
chamou a atenção para além da província. Até a conservadora Igreja Católica de Quebec passou a
apoiar os mineiros.
As partes chegaram a um acordo em julho daquele ano. Para os trabalhadores, os ganhos foram
poucos. Muitos não foram recontratados e a insalubridade permaneceu alta (em 1974, as minas de
Quebec foram consideradas as mais perigosas do mundo).
Mas a Greve de Asbestos seria marcante para a Revolução Tranquila, época de grandes
transformações em Quebec nos anos 1960, como a secularização da sociedade, a criação de um
estado de bem-estar social e investimentos fartos em educação.
A greve também teve impacto entre intelectuais, em especial os três amigos Jean Marchand, Gérard
Pelletier e Pierre Trudeau, críticos do movimento separatista de Quebec e que se lançaram na
política após os eventos de Asbestos. Os três teriam projeção nacional, especialmente Pierre, que
foi primeiro-ministro do Canadá entre 1968 e 1979 e de 1980 a 1984. Desde 2015, quem ocupa o
cargo é seu filho mais velho, o midiático Justin Trudeau.
A pequena Asbestos mudará de nome, mas os efeitos de suas minas continuarão reverberando nos
pulmões e no coração dos canadenses. Para o bem e para o mal.